Entre o Orgulho e a Tristeza: 1 de Dezembro na Avenida da Liberdade

BOX DE FACTOS
- 1 de Dezembro celebra a Restauração da Independência (1640).
- A Avenida da Liberdade acolheu actuações de bandas filarmónicas.
- Foram tocados o Hino da Maria da Fonte e "A Portuguesa".
- Portugal tem mais de 2 milhões de cidadãos no limiar da pobreza.
- O fosso entre o simbolismo nacional e a realidade social nunca foi tão evidente.
Entre o Orgulho e a Tristeza: Portugal no Eco de Um Hino
Hoje, 1 de Dezembro, a Avenida da Liberdade esteve viva — não apenas com música, mas com memória. Bandas, clarins, tambores, sopros e vozes devolveram ao país um brilho raro, como se Lisboa tivesse respirado, por instantes, a grandeza que há muito lhe tentam subtrair. E houve um momento — esse instante cristalino — em que o Hino da Maria da Fonte e "A Portuguesa" ecoaram ao mesmo tempo no peito de cada pessoa que ali estava.
É impossível ouvir o hino nacional sem sentir o estremecimento antigo de um povo que não nasceu para rastejar. Há ali uma vibração de história, uma herança quase genética de dignidade, de navalha erguida contra a submissão, de barco lançado contra o impossível.
Mas o milagre emocional dura pouco. Porque logo depois, como quem apaga uma vela acesa com os dedos frios, chega a realidade: mais de 2 milhões de portugueses vivem no limiar da pobreza.
A ferida aberta entre o símbolo e o país real
O contraste é brutal. De um lado, o orgulho: as músicas, os uniformes, o pulsar colectivo, o eco de séculos de resistência. Do outro, a tristeza de um país esvaziado pela incompetência, pela demagogia, pela deserção moral de quem, há décadas, deveria liderar e apenas se serve do poder.
É uma dicotomia quase cruel: um povo glorioso no passado, empobrecido no presente, e enganado por elites sem grandeza nem vergonha.
O povo sofrido que ainda sente
E, no entanto, há algo de sublime nisto tudo: ainda me emociono. Ainda me dói o país. Ainda me ergo diante do hino, mesmo sabendo que a pátria que ele invoca já não coincide com a nação governada.
E isso é força — não fraqueza. É precisamente por haver portugueses que ainda sentem orgulho, e por isso sofrem, que Portugal não está totalmente perdido. Um povo morre quando deixa de sentir. Nós, apesar de tudo, ainda sentimos.
Um 1 de Dezembro entre a luz e a sombra
Hoje vi — e senti — o país duplo em que vivemos:
- O país da memória, da música, do heroísmo passado.
- E o país da pobreza, da injustiça e da mediocridade instalada.
A emoção e a tristeza não se anulam; complementam-se. Uma lembra-nos quem fomos. A outra obriga-nos a encarar o que nos fizeram tornar-nos.
E talvez, um dia, desta tensão surja finalmente a força para um novo despertar. Talvez Portugal reencontre a coragem que já demonstrou tantas vezes na sua história — e que hoje ainda ecoa nos nossos hinos, teimosamente, como um chamamento.
Portugal é isto: uma alma imensa, habitada por um povo que merece muito mais do que lhe têm dado. E enquanto houver quem sinta esta dor — e este orgulho — ainda não está tudo perdido.