Trump e o Eclipse da Verdade: A Política Transformada em Delírio

Trump, a BBC e a Farsa da Verdade: O Lunatismo que Continua Impune
Trump processa a BBC por "imprecisões" enquanto continua a espalhar notícias falsas e teorias conspirativas há mais de uma década. A coerência é opcional; a disrupção, constante.
Há momentos na História em que a ironia deixa de ser um recurso literário e passa a ser um método político. Donald Trump queixar-se da BBC por "imprecisão" é um desses momentos: uma espécie de eclipse moral, um curto-circuito lógico no qual o maior propagador de falsidades da era moderna se declara vítima da mentira.
É quase cómico. É quase trágico. É, acima de tudo, profundamente revelador.
O Homem que Vive da Mentira, a Exigir Pureza Jornalística
Trump partilhou recentemente uma notícia falsa afirmando que Barack Obama teria recebido milhões em "direitos de autor" pelo Obamacare — uma invenção de um site satírico publicada em 2017. A história já tinha sido desmentida inúmeras vezes, arquivada nas gavetas do disparate, e ainda assim ressurgiu nas mãos do mesmo homem que agora exige indemnização da BBC por alegado mau jornalismo.
Há aqui um padrão: Trump só se indigna quando a mentira não é dele.
Ninguém o Para Porque Ele Não Age Sozinho
Trump não é um meteorito aleatório caído na democracia americana. É o produto directo de um ecossistema onde a verdade se tornou negociável e a mentira passou a ser ferramenta política legítima.
Cinco forças alimentam este ciclo vicioso:
- uma máquina de desinformação colossal;
- uma base política galvanizada pelo ressentimento e não pelos factos;
- uma comunicação social capturada por audiências e cliques;
- uma justiça que se move demasiado devagar para deter a mentira instantânea;
- um sistema político fragmentado que perdeu a noção de centro, de ética e de consequência.
Neste cenário, Trump não é um acidente: é um sintoma. É a febre que denuncia a infecção profunda na república.
A Mentira Como Estratégia de Poder
Para Trump, a mentira nunca foi falha moral: sempre foi instrumento. Ele mente para desviar atenções, mente para mobilizar a base, mente para confundir adversários, mente para testar limites. E quanto mais o sistema democrático tolera, mais ele avança.
A mentira é o seu combustível. A indignação é o seu teatro. A impunidade é o seu habitat.
E a Pergunta Que Ecoa: Ninguém o Para?
A resposta é tão simples quanto dura:
Ninguém o para porque ele opera no exacto espaço onde o sistema falhou — o espaço entre o espectáculo e a verdade.
Um espaço onde a mentira rende votos, a impunidade rende poder e o caos rende cliques.
E enquanto este espaço existir, Trump — e todos os que vierem depois dele — continuará a habitá-lo como um profeta invertido da pós-verdade.
A tragédia não é ele existir. A tragédia é haver um sistema que o deixa prosperar.