O Ministro da Evidência: quando governar é constatar o óbvio

- Declaração recente: "O maior problema dos portugueses é a falta de rendimentos."
- Portugal tem salários 40% abaixo da média europeia.
- Carga fiscal recorde: mais de 36% do PIB.
- Produtividade estagnada há duas décadas.
- Corrupção e despesa pública ineficiente drenam a riqueza nacional.
O Ministro da Evidência: quando governar é constatar o óbvio
Há dias em que a política portuguesa se aproxima perigosamente da comédia absurda. O ministro, com ar grave e expressão de quem acabou de descobrir o átomo, anuncia à nação: "O maior problema dos portugueses é a falta de rendimentos." E a plateia de assessores anota, com fervor quase religioso, esta revelação bíblica.
O governo dos tautólogos
Portugal tornou-se o país da evidência remunerada. Governar passou a ser o acto solene de descrever o desastre. Dizem que há pobreza, desigualdade, baixos salários, fuga de jovens, impostos sufocantes — como se isso fosse uma descoberta inédita e não o resultado directo de décadas de má governação. A política nacional converteu-se num catálogo de constatações, sem um único plano consequente. É o governo do óbvio, onde se diagnosticam feridas sem nunca tocar nelas.
O país do salário de sobrevivência
Os rendimentos não sobem porque a estrutura económica foi desenhada para manter o cidadão na linha da subsistência. É a fórmula perfeita para um país dócil: impostos altos, salários baixos, e promessas médias. Enquanto a elite financeira e política se banqueteia na sombra das parcerias públicas e privadas, o trabalhador vive entre recibos verdes e crédito pessoal. Em Portugal, quem trabalha é penalizado; quem especula é homenageado.
Falta de rendimentos ou excesso de parasitas?
O problema não é o que falta aos portugueses — é o que sobra ao Estado. Sobra despesa, sobra burocracia, sobra desperdício, sobra corrupção. Cada euro arrancado ao salário é um imposto para sustentar organismos redundantes e cargos inúteis. Há ministérios que se multiplicam por mitose e assessorias que florescem como ervas daninhas em jardins públicos.
A política do "nada podemos fazer"
Quando confrontados com a realidade, os governantes refugiam-se na desculpa clássica: "O problema é estrutural." Traduzindo: não sabemos, não queremos, nem temos coragem. É a rendição com crachá de competência. O poder transformou-se num balcão de gestão da impotência, onde se fingem reformas enquanto o país definha entre relatórios e conferências.
O silêncio do povo e a insolência do poder
Ainda mais inquietante que a mediocridade dos governantes é a resignação dos governados. O povo aprendeu a viver de ironia: ri-se da miséria, partilha memes, e volta a votar nos mesmos. Enquanto isso, os ministros da evidência continuam a discursar, convictos de que o diagnóstico é acção e a constatação é reforma.
Epílogo
Portugal não precisa de mais ministros que descrevam a realidade — precisa de quem a transforme. A falta de rendimentos não é uma estatística, é uma sentença. E cada frase sem consequência é mais um golpe no país real, aquele que trabalha e não é ouvido. Chega de tautologias com gravata: a evidência já não é notícia — é insulto.
Portugal precisa de menos emoção teatral e mais ação moral. Menos lágrimas públicas e mais coragem privada. O dia em que um ministro, em vez de "chorar com os portugueses", agir pelos portugueses, será o primeiro dia de um país novo.
Coautoria e edição: Augustus Veritas Lumen — Série Contra o Teatro da Mediocridade