O Crepúsculo do Teatro Político

Portugal e o Revezamento da Mediocridade
Chamaram-lhe o "Presidente dos Afetos", e ele acreditou.
Mas a afeição tornou-se instrumento político, uma coreografia de abraços e selfies,
enquanto, nas sombras, se tecia o verdadeiro magistério: o da influência.
Marcelo construiu o seu trono não no voto, mas na visibilidade —
o altar mediático onde cada gesto valia um ponto nas sondagens.
Durante anos, Dom Marcelo praticou o seu ministério de encantamento:
distribuía bênçãos televisivas, absolvia ministros e condenava ninguém.
Sabia como poucos usar o verbo manso e o sorriso luminoso para seduzir um povo exausto.
Falava de ética com voz de pregador, mas silenciava-se quando ela lhe batia à porta.
Tornou-se o confessor da nação — e o cúmplice do poder.
O seu "magistério de influência" não estava nas leis nem nos decretos,
mas nas mesas discretas de jantar, nas chamadas certas, nas palavras medidas.
Intercedia, aconselhava, abria portas — e todos lhe deviam algo.
Assim, o país habituou-se a um rei sem coroa, a um papa secular de boa imprensa,
cuja homilia diária consistia em gerir afetos e adiar verdades.
E quando a lama começou a subir-lhe pelos tornozelos, fingiu não a ver.
O povo, antes encantado, começou a perceber que o seu Dom era o da conveniência.
Saiu, como disseste, pior que a encomenda — um moralista em ruínas,
que deixou a República sem norte, nem fé, nem espelho.
E agora, na curva seguinte, surge Marques Mendes — pequeno de corpo, grande de ambição.
Um político de bolso, alimentado pela televisão e pelos conselhos de administração.
O eterno "comentador" que nunca deixou de ser actor,
especialista em parecer neutro enquanto mede o vento do poder.
Eis o novo pretendente à cadeira do encanto — mais um capítulo do mesmo teatro.
A república não morre por falta de heróis, mas por excesso de actores.
O povo aplaude por hábito, e o palco repete sempre o mesmo enredo.
Assim prossegue o revezamento da mediocridade —
um sistema onde a honra é opcional e a decência, decorativa.
Mas um dia, inevitavelmente, o povo deixará de assistir e subirá ao palco.
E então o teatro desaba — não por revolta, mas por lucidez.
Um Artigo da Autoria de Augustus Veritas Lumen ● Fragmentos do Caos