República dos Isentos: a democracia que só morde para baixo

Quando a banca que engoliu fortunas e as empresas com lucros de bilhão tratam os impostos como opinião — e o povo paga como obrigação.

Lisboa · Francisco Gonçalves & Augustus Veritas Lumen

Barragem com queda de água transformada em moedas sobre o Douro
Balança do betão: quando a água se torna imposto.

Resumo em uma frase: em Portugal, há quem trate o fisco como sugestão e quem o viva como sentença; não é destino — é desenho institucional.

Canalhocracia, acto I — a magia do desaparecimento

A banca que fez desaparecer riqueza não o fez com truques de salão, mas com a velha liturgia do risco privatizado e do prejuízo socializado. O povo entrou pela porta do cofre — não para o abrir, mas para o sustentar. E, passada a hora crítica, voltaram os brindes, os bónus, as rendas confortáveis. O imposto, aí, é sempre uma hipótese; a corda, essa, estica para o lado previsível.

Acto II — lucro de bilhão, imposto de opinião

Quando empresas com lucros de mil milhões discutem "se é devido", sabemos que a arquitectura do poder funciona. O pobre paga a tempo; o poderoso paga quando quiser — se quiser. No meio, uma névoa de pareceres, recursos e garantias que transforma a justiça fiscal numa maratona para pernas cansadas.

Acto III — o contribuinte invisível

Há um país que não cita legislação, mas sabe contas: o da renda, do passe, do cabaz, das propinas dos filhos, do IMI, do IVA no pão. Esse país paga tudo — e paga sempre. A cidadania que não tem lobby tem recibo. E a democracia que não o protege deixa de o merecer.

Box de Contexto

  • Litigância fiscal prolongada e garantias adiam o efeito caixa do Estado, mesmo quando a liquidação é devida.
  • Benefícios e planeamentos agressivos criam assimetrias entre quem tem departamentos fiscais e quem tem apenas salários.
  • Sem execução célere e juros punitivos, a mensagem é simples: compensa discutir — e não compensa cumprir.

Plano mínimo de decência (5 medidas praticáveis)

  1. Execução prioritária para grandes montantes: prazos curtos, equipas dedicadas, fast track no contencioso fiscal.
  2. Juros efectivamente dissuasores e naming agregado (sem segredos comerciais) de litigância sistemática que adie pagamento devido.
  3. Cláusula geral anti-abuso musculada, com ónus de prova reforçado para reestruturações que só procuram poupança artificial.
  4. Relato país-por-país e public country-by-country reporting para grupos com contratos públicos ou rendas reguladas.
  5. Responsabilização de administradores em caso de artifícios dolosos que lesem o erário — com impedimento temporário para contratar com o Estado.

Não é destino — é decisão

Democracia não é a soma dos votos; é a soma das responsabilidades. Enquanto os impostos forem facultativos para cima e compulsórios para baixo, o nome do regime é outro: canalhocracia. E contra isto não há milagre — há reforma.

"Que o próximo Orçamento não seja um acto de fé, mas um contrato de justiça: quem lucra muito, contribui muito; quem pouco tem, que não sangre."

Assinatura. Francisco Gonçalves & Augustus Veritas Lumen — crónica de opinião com sede de transparência e fome de justiça.

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