🕰️ A Europa Que Sonhou o Futuro : ICL OPD

Crónica Histórica — A Brisa Europeia da Inovação
Em 1984, a ICL (Reino Unido) lançou o OPD — One Per Desk: telefone, computador, modem e secretária electrónica num único equipamento. Uma visão integrada do escritório moderno, anos antes do mundo estar preparado para a convergência digital.
ICL OPD (1984): O Computador-Secretária que Antecipou o Século XXI
Por Francisco Gonçalves & Augustus Veritas — Fragmentos do Caos
Ano: 1984
Fabricante: ICL – International Computers Limited (UK), em colaboração com a Sinclair/BT (variante Merlin Tonto)
Conceito: "Um por secretária" — telefone + computador + comunicações num só corpo
CPU: Motorola 68008 (derivado do 68000), ~7,5 MHz
RAM: 128 KB base (expansível)
Armazenamento: Microdrives duplos (cartuchos magnéticos de alta rotação)
SO: QDOS (derivado/compatível), multitarefa cooperativa, com software empresarial da ICL/Psion
Comunicações: Modem integrado e telefone de secretária com integração PABX
Distintivo: Convergência total de voz, dados e produtividade num único equipamento
1) O contexto: quando a Europa ousou integrar
O OPD nasce num momento charneira: a computação pessoal explode, mas o escritório ainda vive entre papel, fax e PABX. A ICL propõe algo ousado — um terminal de trabalho completo que junta telefone inteligente, computador multitarefa e serviços de dados. Em vez de cabos e caixas avulsas, um só objecto a comandar o dia de quem produz.
2) A máquina por dentro: elegância de engenharia
No coração, o Motorola 68008, irmão económico do 68000, a mover um sistema operativo QDOS com multitarefa cooperativa. Os microdrives trocam a disquete por cartuchos velozes, e o telefone integra-se no corpo do equipamento com modem embutido, agenda, mensagens e ligação a PABX. Software de produtividade (texto, folha de cálculo, agenda, mensagens) completa o ecossistema — um "desktop" de 1984, literalmente.
3) O salto conceptual: do "PC + periféricos" ao "poste de trabalho"
Enquanto o mundo via o PC como caixa + monitor + modem + telefone (tudo separado), a ICL entrega um posto de trabalho unificado. A visão é cristalina: trabalhar é comunicar. O OPD reduz fricção, liga voz e dados, e transforma a secretária num painel de comando — anos antes da expressão "unified communications" ganhar moda.
4) Porque falhou o que merecia vencer?
- Timing e mercado: a maioria das empresas ainda não entendia a vantagem da convergência; comprava-se "PCs" por checklists, não por visão.
- Preço e canal: integração custa — e o canal de vendas estava treinado para caixas modulares (PC + placas + modem), não para soluções "monobloco".
- Compatibilidade e perceção: o ecossistema "IBM-compatible" crescia em avalanche; tudo o que fugia ao padrão era visto como "exótico".
- Microdrives: elegantes e rápidos, mas com mindshare inferior às disquetes; a logística de software não ajudou.
5) Comparações justas (e necessárias)
Macintosh (1984): uma obra-prima de interface, mas sem modem/telefone integrados e nascido para single-user puro.
IBM PC (1981): venceu pela arquitetura aberta e pelo ecossistema, não pela integração.
ICL OPD (1984): único a entregar telefone+modem+produtividade no mesmo corpo — a ideia certa antes do seu tempo.
6) Legado: os ecos que hoje reconhecemos
O OPD prefigura o que hoje consideramos normal: dispositivos convergentes, workflows unificados, comunicações acopladas às aplicações, e multitarefa como condição natural. Foi workstation de secretária antes das workstations, smart desk antes das smart offices, UC antes do acrónimo.
7) Linha temporal mínima
- 1981 — IBM PC impõe o padrão "compatível".
- 1984 — ICL lança o OPD — One Per Desk: a aposta europeia na integração.
- Décadas seguintes — o mercado valida, lentamente, a convergência (PBX IP, fax-modem, VoIP, suites integradas, softphones).
"A Europa imaginou primeiro o escritório convergente; o mundo só chegou lá quando o marketing aprendeu a pronunciar a palavra 'integração'."
— F. Gonçalves