Reflexos Partidos: A Inocência Fabricada dos Corruptos em Portugal

Os Inocentes do Crime: A Ética Submersa dos Corruptos Portugueses
Isaltino Morais, Carlos Cruz, Duarte Lima, Vara, Rendeiro, Sócrates… uma galeria de nomes que, após condenados, continuam a jurar inocência. Um fenómeno português onde o crime é negado até depois da sentença.
Há um traço quase artístico na forma como o corrupto português se defende. É o Picasso da dissimulação, o Camões da desculpa, o Fernando Pessoa das versões contraditórias. E quando sai da prisão — perfumado, sorridente, lavado de culpas — olha-nos de frente e proclama: "Sou inocente."
Em Portugal, o corrupto não é um criminoso comum. É um "homem de Estado", um "gestor de sucesso", um "benemérito da terra". O crime, quando o comete, é tratado como um lapso, uma "injustiça", uma "má interpretação do Ministério Público". Quando condenado, o corrupto diz-se vítima. E o povo, cansado e descrente, encolhe os ombros.
Esta é a tragédia moral portuguesa: um país onde o poder serve de manto à impunidade, onde a esperteza é confundida com inteligência e o roubo com habilidade política. Crescem dentro de um ecossistema de favores e cumplicidades, e acreditam piamente que o mundo lhes deve perdão eterno.
Não sentem culpa, porque a culpa requer consciência moral — e a deles evaporou-se há muito, corroída pelo luxo, pela vaidade e pelo narcisismo social. Os corruptos são os filhos mimados de uma nação tolerante, de um povo habituado a ver o crime ser recompensado e o mérito ser esquecido.
Quando um destes senhores da moral invertida é apanhado, reage como um actor ferido na dignidade: dramatiza, chora, culpa o "sistema". E o mais grotesco — volta a ser eleito, entrevistado, homenageado.
"Chamam-se inocentes, porque a vergonha já não mora cá.
O ouro do crime brilha-lhes nas algibeiras,
mas o espelho do povo — esse —
já não lhes devolve rosto, apenas sombra."
A cidadania, não é apenas um cartão ou um número fiscal — é uma pertença ética. Quem trai a comunidade, saqueia o erário e mente sem remorso, renunciou a ser cidadão. É um exilado moral dentro da própria pátria.
Enquanto Portugal continuar a venerar os seus ladrões elegantes, continuará prisioneiro da mediocridade política e do teatro da impunidade. E o país — esse palco triste — verá sempre o mesmo elenco a repetir o mesmo acto: a tragédia nacional da vergonha sem culpa.
© Francisco Gonçalves | Série Contra o Teatro da Mediocridade
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