Quando a Paz se Torna um Espetáculo — e a Verdade, um Ato de Rebeldia

O Coração de Um Humanitário... Segundo a Casa Branca
Crónica mordaz de um mundo às avessas
"O comité norueguês do Nobel colocou a política à frente da paz", declarou o diretor de comunicação da Casa Branca, com a solenidade de quem anuncia uma descoberta cósmica. O motivo? O prémio Nobel da Paz foi entregue à opositora venezuelana Maria Corina Machado e não a... Donald Trump.
Sim, leu bem. O mesmo Trump que insultou aliados, elogiou ditadores, rasgou tratados e ameaçou bombardear meio mundo. Pois, ao que parece, há em Washington quem acredite que o homem que prometeu construir muros e dividir povos é, na verdade, um missionário da paz universal.
O comunicado continua: Trump "tem o coração de um humanitário". Uma frase tão grandiosa que merecia ser gravada na entrada do Teatro do Absurdo, ao lado de uma placa a dizer: "Aqui a lógica está de férias e a decência foi substituída por relações públicas."
A inversão moral
O que a Casa Branca nos oferece não é diplomacia — é teatro. Num mundo onde o poder compra narrativas e o marketing substitui a ética, o "humanitarismo" tornou-se uma palavra inflacionada, usada como perfume barato para disfarçar o cheiro a cinismo.
Trump é o humanitário que faz da empatia um negócio. A Casa Branca, o coro de louvor. E o mundo, o público que, entre o riso e o desalento, se pergunta: quanto mais baixo pode cair o conceito de paz?
O verdadeiro prémio
Maria Corina Machado arrisca a vida contra uma ditadura. Não tem guarda-costas milionários, nem exércitos de advogados, nem fortunas escondidas em paraísos fiscais. Apenas coragem. E é essa coragem que a Casa Branca chama de "política à frente da paz".
Mas a verdade é simples: o prémio Nobel da Paz foi devolvido ao seu sentido original — a resistência de quem se levanta contra o medo. E isso, talvez, seja demasiado incómodo para quem confunde poder com virtude.
"O coração de um humanitário", disseram eles. Talvez. Mas um coração que bate ao som do dinheiro e do aplauso, não ao compasso da humanidade.
No fim, o Nobel continua a cumprir a sua missão — dar voz aos que lutam pela liberdade. Já os que lutam apenas pela vaidade, esses terão de se contentar com o aplauso ensaiado dos seus próprios espelhos.
Fragmentos do Caos — Série "Contra o Teatro da Mediocridade"
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