Gestão à Portuguesa: A Arte Antiga da Mercearia, mas agora com Excel

🍞 A Arte Portuguesa de Crescer Até Estourar
ou Como se Coze o Pão da Insolvência
Por Francisco Gonçalves & Augustus Veritas Lumen · Fragmentos do Caos / SofteLabs
Portugal é um país onde o sucesso empresarial é medido pela velocidade com que se abre a próxima loja. Não se fala em rentabilidade, sustentabilidade ou consolidação. Fala-se em expansão — esse feitiço económico que transforma sonhos em dívidas.
O caso da Gleba, padaria artesanal que cresceu vertiginosamente em Lisboa, é apenas o último capítulo da mesma história antiga: um projeto de mérito que confundiu ambição com inflação, e acabou a reestruturar uma dívida de oito milhões de euros.
Em Portugal, o empreendedorismo é como o pão quente: cresce depressa, racha por dentro e arrefece mal sai do forno.
1️⃣ O síndrome do "crescer ou morrer"
Há uma doença silenciosa na economia portuguesa: o complexo da grandeza instantânea. Os empresários são incentivados a expandir — não a consolidar. A cultura dominante é a do "scale-up", o fetiche da multiplicação, a crença cega de que abrir dez lojas é melhor do que ter duas lucrativas.
É o mesmo vírus que infeta o turismo, a restauração, o retalho e até as startups tecnológicas: o delírio da expansão mediática sem base estrutural.
Crescimento é a palavra mágica dos relatórios — mesmo que signifique apenas dívida com decorações.
2️⃣ O romantismo da dívida
Em Portugal, o crédito não é instrumento — é identidade. As empresas vivem entre empréstimos, leasing e renegociações, como se o endividamento fosse sinónimo de sucesso. Quando os juros sobem ou as vendas estabilizam, o milagre transforma-se em missa fúnebre.
O país adora histórias de crescimento rápido. Detesta relatórios de gestão racional. Porque a prudência não dá manchetes; o colapso, sim.
3️⃣ Gestão à portuguesa
O padrão repete-se: expansão sem estrutura, equipa sem gestão profissional, marketing à frente da contabilidade, e o inevitável "plano de reestruturação" como epílogo. A Gleba é apenas o pão do dia — amanhã virá outra empresa, outro setor, outro discurso igual.
O problema não é o empreendedorismo — é o amadorismo institucionalizado. O Estado aplaude, os bancos financiam, e a imprensa cobre o desastre como se fosse epopeia.
Chamam-lhe reestruturação. Eu chamo-lhe pão queimado — com açúcar por cima para disfarçar o sabor.
4️⃣ Uma metáfora nacional
Portugal é o país onde se confunde o forno com o destino. Onde se acha que a massa cresce sozinha, sem paciência, sem tempo, sem fermento. Onde tudo se quer quente, rápido e visível — mesmo que vazio por dentro.
O caso Gleba é o espelho da economia portuguesa: feita de boa vontade, criatividade e alguma ingenuidade, mas refém de uma cultura empresarial que recusa aprender. Um país onde o sucesso é pressa e o erro é sempre surpresa.
Portugal é o único país onde até o pão artesanal acaba por precisar de consultores financeiros.
Francisco Gonçalves & Augustus Veritas Lumen
Fragmentos do Caos · Outubro 2025