A Lei das Rotundas — O Círculo Vicioso do Absurdo Legal

🚗 Box de Factos

  • Desde a entrada em vigor da nova lei das rotundas, multiplicaram-se os acidentes e as interpretações contraditórias.
  • Em muitos casos, os condutores que cumprem o código acabam injustamente considerados culpados pelos sinistros.
  • As seguradoras e peritos divergem na aplicação prática da lei, gerando decisões incoerentes e penalizações indevidas.
  • Falta intervenção do IMT, ASF e ANSR para clarificar e harmonizar a aplicação do Art.º 14.º-A do Código da Estrada.

Uma lei que inverteu o bom senso

Foi com pompa e convicção que se anunciou a "modernização" da lei das rotundas. O objetivo era simples: clarificar. O resultado foi desastroso: confundir. A partir do momento em que a via exterior passou a ser "legalmente neutra", a regra deixou de proteger o condutor prudente e passou a premiar o distraído.

Quem cumpre o código — circulando pela via interior e aproximando-se à direita apenas na saída anterior à pretendida — tornou-se, paradoxalmente, o novo culpado. Enquanto isso, os que vagueiam pela faixa exterior, sem pisca nem intenção de sair, gozam de imunidade tácita perante peritos e seguradoras. É o triunfo da aparência sobre o direito.

O paradoxo do cumprimento

A nova norma introduziu um dilema quase filosófico: cumprir a lei é, por vezes, o caminho mais rápido para ser condenado. E quem a ignora, mas parece "previsível" aos olhos da seguradora, sai ileso. O código da estrada tornou-se, assim, um jogo de interpretação livre, onde cada sinistro é julgado não pela norma, mas pelo instinto do perito.

O condutor que respeita o Art.º 14.º-A do Código da Estrada é agora suspeito. E o que o ignora é visto como prudente — um paradoxo digno do teatro do absurdo.

O erro de conceção

A lei portuguesa inspirou-se em modelos europeus que pressupõem rotundas amplas, sinalizadas e bem desenhadas. Mas aplicou-se a um país de rotundas minúsculas, mal pintadas, sem visibilidade nem coerência geométrica. É como tentar reger uma sinfonia de Beethoven dentro de um Fiat Panda.

O legislador quis impor uma regra universal a um caos particular — e conseguiu o pior de ambos: a confusão generalizada e o aumento do risco. As rotundas, símbolo da fluidez, tornaram-se pequenas arenas de litígio rodoviário.

O silêncio dos reguladores

IMT, ASF, ANSR — todos emudecem diante do problema. Ninguém quer reconhecer o erro estrutural da norma, nem a sua incompatibilidade com a realidade portuguesa. E enquanto as entidades estudam, os condutores pagam: em danos, em prêmios de seguro e em injustiça.

Não há país que se mova em círculos tão perfeitos como o nosso. Aqui, o trânsito é metáfora: cada rotunda é uma parábola da burocracia.

Conclusão: o círculo vicioso

A lei das rotundas é o espelho de Portugal — bem-intencionada, mal executada e pior aplicada. Transformou o espaço que devia ordenar o movimento num palco de indecisões e culpas cruzadas. E o país continua a girar, de sinistro em sinistro, à procura de uma saída que ninguém sinalizou.

"Em Portugal, até a lei gira em círculo — e o bom senso foi atropelado na segunda saída."


✍️ Francisco Gonçalves & Augustus Veritas Lumen

Série "Contra o Teatro da Mediocridade" — Fragmentos do Caos

🌌 Fragmentos do Caos: Blogue Ebooks Carrossel
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