Autarcas em Cena: o circo da propaganda e o público cansado

A República dos Populistas: o circo autárquico e a decadência da política local
Chegou mais uma campanha autárquica — essa romaria de slogans, sorrisos e promessas recicladas. As ruas enchem-se de cartazes onde cada rosto finge pureza e cada frase é um espelho estilhaçado de moral. Prometem o céu em nome da freguesia, mas trazem o inferno dentro do bolso.
Não é só o Chega com o seu populismo raivoso e tribal. É o PS com a sua demagogia de plástico, e o PSD com a sua amnésia selectiva — todos a falar como se tivessem aterrado de Marte ontem, todos a prometer "mudança", "transparência" e "proximidade" como se não tivessem governado as mesmas terras durante décadas. A mentira tornou-se tão natural que já ninguém sente vergonha de mentir.
Vivemos num país onde o populismo já não é uma ideologia — é uma técnica de sobrevivência. Cada candidato fala para a câmara fotográfica, não para o povo. As palavras "honestidade", "serviço público", "ética" aparecem nos discursos com a mesma frequência com que desaparecem dos orçamentos camarários.
As autarquias tornaram-se feudos, pequenos reinos de caciques que distribuem cargos como favores e favores como cargos. Obras inúteis, rotundas faraónicas, jardins que custam o preço de escolas. E tudo acompanhado do mesmo refrão: "Estamos a trabalhar por todos". Mentira. Trabalham para se manter à tona — e, de preferência, com motorista e assessoria paga.
Os partidos tradicionais aprenderam o truque do populismo: não se faz política, faz-se marketing emocional. Não se governam comunidades, gerem-se emoções. E o povo, anestesiado por slogans e medo, acaba por votar em quem fala mais alto — não em quem pensa mais fundo.
O resultado é este país exausto, cínico, que já não acredita em nada. Cada campanha é uma ressaca moral, cada eleição um ritual de resignação. Portugal envelheceu de tanto ouvir promessas que nunca nascem, e candidatos que prometem "mudança" enquanto carregam nas costas o passado que fingem não ter.
E no meio disto tudo, há um silêncio mais perigoso que qualquer grito: o silêncio dos que ainda acreditam que não há alternativa. Mas há — começa na consciência de que o voto não é um gesto de fé, é um ato de lucidez. E que o poder local só voltará a ser digno quando os cidadãos deixarem de se ajoelhar perante o populismo e a corrupção.
Portugal precisa de autarcas com alma, não de figurantes com agência de publicidade. Precisa de ética, não de outdoors. Precisa de futuro, não de campanhas.
Francisco Gonçalves & Augustus Veritas Lumen
Fragmentos do Caos · Outubro de 2025
"O tirano é aquele que coloca a sua vontade no lugar das leis." -Voltaire