Medicina com nota 9: a decadência de um país que brinca com a vida

Editorial — mérito, coerência e a dignidade de quem confia nas instituições
Opinião

Há limites que não se deviam transpor. Um deles é a exigência mínima para formar médicos. Quando se abre a porta da Faculdade de Medicina a alunos com nota 9 em 20, a mensagem é brutal: até a vida humana pode ser relativizada ao sabor das conveniências.

Num país normal, a nota mínima de acesso a Medicina seria sagrada. Não é elitismo — é responsabilidade. Um médico não pode ser medíocre, porque um erro não reprova apenas no exame: reprova na vida de quem dele depende.

Coerência não é um adereço institucional.
Em 2019, aceitámos. Em 2025, rejeitamos. A lei é a mesma; o discurso, não. O que mudou? A verdade ou a conveniência?

No meio do teatro, estão os estudantes. Receberam emails oficiais a confirmar que tinham entrado — antes da homologação. Mudaram de vida, celebraram, confiaram. Depois, a rasteira: "não está homologado". Não há maior violência do que brincar assim com o futuro de jovens que honram o estudo e a disciplina.

A pergunta impõe-se: que país admite futuros médicos com nota 9? O mesmo que naturaliza escândalos, tolera incoerências e transforma a meritocracia num mito de ocasião. Onde "excelência" é slogan, não prática.

Nota ao leitor: a defesa do mérito não exclui apoios sociais, diversidade de percursos ou segundas oportunidades. Exige, isso sim, padrões mínimos intransigentes nas profissões em que um desvio custa vidas.

E depois espantam-se com a emigração dos melhores. Lá fora, sabem que a vida não é uma peça com reitores e diretores em palco a trocar acusações: é coisa séria. Por cá, continuamos a ensaiar. Quem paga bilhete? Nós todos.

Publicado em Fragmentos do Caos — por Francisco Gonçalves & Augustus Veritas Lumen.

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