O pilar rachado da democracia

A Justiça-Paródia: o caso Sócrates e a credibilidade perdida
Quando o tribunal vira palco e a autoridade se dissolve em espetáculo.
O julgamento de José Sócrates tornou-se uma liturgia ao contrário: em vez de devolver solenidade à Justiça, expõe-lhe a fragilidade em praça pública. O arguido fala quando quer, interrompe, desafia. A juíza suspira, adverte, repete. O país assiste. E cada sessão adensa a sensação de que caminhamos não para a verdade judicial, mas para uma telenovela forense.
Uma Justiça que tolera a desordem constante transforma o contraditório em cacofonia — e a autoridade em rumor.
Três sinais de decadência institucional
- Ritual sem gravidade: a sala de audiências deveria impor silêncio e respeito. Se o arguido dita o ritmo, já não é julgamento — é encenação.
- Sanções que não chegam: advertências sem consequência normalizam a indisciplina e debilitam a imagem de imparcialidade e força do tribunal.
- Tempo que corrói a fé pública: morosidade, incidentes, recursos intermináveis. A Justiça deixa de ser solução e passa a paisagem.
O dano invisível: confiança
A justiça vive de símbolos tanto quanto de códigos. Se a lei é espada, o respeito é o fio dessa lâmina. Sem ele, corta-se apenas o papel. Quando um ex-primeiro-ministro transforma o tribunal em púlpito de combate, não é apenas o seu caso que se julga: julga-se a capacidade do Estado de aplicar a lei sem medo nem favoritismo.
O que seria mínimo, já
- Disciplina efetiva em audiência (registo de advertências e aplicação célere de medidas previstas no CPP).
- Calendário processual vinculativo, blindado a expedientes dilatórios que não tragam mérito.
- Transparência pedagógica: comunicados curtos, factuais, após sessões críticas, para conter a espuma mediática.
- Gestão de tempos e perguntas com cronómetro: contraditório sim, conferência de imprensa não.
Porque isto importa
Uma Justiça que se deixa parodiar em direto não é neutra: é um convite à impunidade. O recado que passa é simples e devastador: quem tem palco, manda; quem tem razão, espera. Mas Abril não foi feito para transformar tribunais em auditórios — foi feito para dar aos tribunais a dignidade que protege os fracos dos fortes.
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