Autárquicas 2025: teatro velho, plateia cansada — e a democracia por cumprir

Crónica para quem recusa a resignação: não basta votar, é preciso vigiar — e mandar fazer.

Box de Factos (Portugal, 2021–2025)

  • As eleições autárquicas realizam-se 12 de outubro de 2025 (Decreto n.º 8/2025). Voto antecipado: estudantes/doentes/pessoas presas 29 set–2 out; por motivos profissionais 2–7 out. CNE.
  • Em 2021, a abstenção foi 46,35% — segunda mais alta em autárquicas desde 1976. Expresso; Lusa/DN.
  • Confiança nas instituições (Portugal, 2024, OECD): partidos 18%, parlamento 31% reportam "alta/moderadamente alta" confiança. OECD.
  • José Saramago advertiu contra a democracia apenas formal e lembrou que ela começa "na rua onde moramos". Fundação José Saramago; Citador.

Prólogo (sem véus)

Portugal aproxima-se de mais uma eleição local e, no entanto, o país parece afastar-se da própria ideia de demos. O palco é conhecido, as falas gastas, os caciques tomam o lugar dos cidadãos e o voto transforma-se em gesto ritual — quando comparece. Saramago perguntaria: é isto a democracia? A resposta honesta é um "ainda não".

I. O diagnóstico sem anestesia

Abstenção alta, confiança baixa, transparência escassa. Em 2021, quase metade ficou em casa; em 2024, só minorias declaram confiar em partidos e no Parlamento. Não é desinteresse genético: é fadiga de promessas e alergia a opacidade. O cidadão olha para o poder local e pergunta: onde estão os dados, as contas, os prazos?

II. Democracia de chão: o que muda já

  1. Votar e vigiar. Marca na agenda: 12 out 2025. Se precisares, usa voto antecipado (janelas acima). Depois do voto, segue contratos, cronogramas e execução orçamental do teu município em dados abertos.
  2. Assembleias de bairro deliberativas. Reuniões mensais com atas públicas e decisão vinculativa em verbas até X€ — orçamento participativo 2.0.
  3. Transparência em tempo real. Portal municipal com dashboards de obras, filas de espera, prazos de licenças e todas as faturas/contratos em formato aberto.
  4. Pacto de integridade. Auditoria externa anual, rastreabilidade de adjudicações e whistleblowing protegido.
  5. Moção de confiança cidadã a meio do mandato. Não para "cair" executivos — para ajustar rumos com luz acesa.

III. Guia relâmpago para escolher

  • Publica contratos e faturas por defeito (CSV/JSON)?
  • Mede resultados (impacto) e não só atividades?
  • Abre espaço a iniciativas cidadãs com decisão real?
  • Aceita auditoria independente anual?
  • Assume avaliação a meio do mandato em assembleia pública?

IV. Um país cansado do teatro

Enquanto o palco insiste no enredo de sempre, a democracia pede ensaio novo: menos cartazes, mais contas; menos promessas, mais prazos; menos culto do chefe, mais poder distribuído. Lembremos Saramago: não basta a forma; é preciso a substância — e ela começa "na rua onde moramos".

"Nós não podemos continuar a falar de democracia no plano puramente formal." — José Saramago

V. Como participar já (checklist de 2 minutos)

  • Confirma mesa e local — se fores ausentar-te, usa voto antecipado nas janelas certas.
  • Descobre o Plano Plurianual e o Orçamento do teu município; anota 3 obras e 3 prazos.
  • Escreve a tua pergunta pública (licenças, mobilidade, saúde, habitação) e envia ao executivo/Assembleia Municipal.
  • Agrega vizinhos: propõe a tua assembleia de bairro deliberativa (regra simples, ata pública, valor-teto).

Epílogo: Se o poder insiste em teatro, sejamos nós luz, microfone e ata. A democracia vive quando a tratamos — como a casa — todos os dias.

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