A Lucidez como maldição

O Êxito como Armadilha: uma reflexão a partir de Agostinho da Silva
"Para quem não é imbecil o êxito constitui um grande risco."
— Agostinho da Silva
Há frases que nos assaltam como relâmpagos e deixam a paisagem da mente para sempre alterada. Esta, de Agostinho da Silva, é uma dessas. Curta. Lúcida. Incómoda. Um pequeno sismo no edifício do senso comum.
Vivemos num mundo rendido à cultura do êxito — medido em seguidores, lucros, visibilidade e notoriedade. Mas o êxito, esse ídolo reluzente, raramente nos pergunta quem somos, o que sonhamos, ou se a nossa alma acompanha o brilho exterior.
Para o imbecil, o êxito é tudo. É meta, aplauso, validação. Para o livre pensador, o êxito é armadilha. É desvio. É veneno.
A grande ilusão do êxito
A sociedade moderna transformou o sucesso num totem. Desde cedo, incutem-nos a ideia de "vencer": no trabalho, nos relacionamentos, nas redes, no espelho. Quem não sobe é derrotado. Quem não brilha é invisível. Quem não produz é descartado.
Mas esse "vencer" exige, tantas vezes, que se traia a própria essência. Que se obedeça, que se curve, que se tape a boca. Que se abrace o status quo. E então, aos poucos, o sucesso torna-se uma prisão com almofadas de veludo.
O êxito é perigoso para quem pensa — porque seduz com recompensas fáceis e fá-las parecer liberdade. Mas o conformismo dourado é ainda assim uma cela.
A lucidez como maldição
Agostinho da Silva sabia que a lucidez é incompatível com o êxito tal como ele é vendido no mercado das vaidades. O homem lúcido vê o sistema como ele é: um teatro de mediocridade, onde se premia o servil e se castiga o íntegro.
O êxito, quando chega, exige manutenção. E manter o êxito pode implicar silenciar a verdade, domesticar o pensamento, apagar a rebeldia. O filósofo vê isso e recua. Ou então, aceita o sucesso com desconfiança — como quem acolhe uma cobra no colo.
Caminho do sábio: abdicar do aplauso
Para o espírito livre, ser bem-sucedido é muitas vezes ser mal-entendido. Porque o seu sucesso não vem de métricas, nem de influência, mas de coerência interior.
Enquanto o mundo corre atrás da validação, o sábio caminha ao lado da verdade. Enquanto os outros se vendem para subir, ele afunda raízes para ser. Enquanto os "vitoriosos" gritam nos palcos, o pensador murmura na sombra.
E é aí, na margem, na solidão consciente, que vive a verdadeira liberdade.
Epílogo: o risco de ser inteiro
O êxito é um risco porque nos pode amputar a alma em troca de uma estátua. Mas a lucidez, quando firme, resiste a esse chamamento. Como dizia Agostinho, o homem inteiro não se curva. Nem à glória. Nem ao sistema. Nem à vaidade.
Que o êxito nunca nos adormeça. Que o reconhecimento nunca nos corrompa. Que a lucidez seja sempre maior que o aplauso.
✍️ Artigo escrito por Augustus Veritas Lumen, inspirado na frase de Agostinho da Silva.