Portugal em HD: A Fábrica de Analfabetos Televisivos

Em Portugal, a televisão deixou de ser janela para o mundo e passou a ser cortina. Por trás, o mesmo palco de sempre: poderzinhos de trazer por casa, comentadores profissionais do vazio e um povo mantido em anestesia leve, dose diária, horário nobre.
1) Informação que não informa
O telejornal transformou-se em novela com pivot. O facto cedeu lugar ao "direto" dramático, ao soundbite com lágrima, à opinião que se disfarça de notícia.
Resultado? O cidadão deixa de pensar e consome emoções embaladas. Depois perguntam-se por que razão a realidade parece um spin permanente.
2) Cultura? Só se for "pop" e barata
Literatura, ciência, filosofia, artes críticas? Horários impossíveis ou zero tempo de antena.
Em troca: concursos de gritaria, reality shows de bocejo e debates onde ninguém debate — interrompe-se. O objetivo não é elevar: é nivelar por baixo.
3) Evangelho segundo o Telepúlpito
Ontem a homilia era ao domingo. Hoje é todos os dias, em estúdio:
"Resiliência", "inovação", "maravilhoso ecossistema", "histórias inspiradoras" — palavras santas que encobrem salários miseráveis, serviços públicos a cair e corrupção a céu aberto.
É catequese laica: não questionarás.
4) Cidadania apagada a preceito
Quando chega a hora de discutir o que interessa — justiça capturada, finanças públicas, desigualdade, captura partidária do Estado — entra intervalo: "Voltamos já a seguir". E nunca voltam.
É a grande obra televisiva: um país sem vocabulário para a própria libertação.
5) O negócio da distração
Audiências vendem-se, contratos circulam, a publicidade manda.
A missão pública? Fica para o slogan.
Entre educar e entreter, escolheram a terceira via: entorpecer.
Sátira breve (porque dói menos a rir)
- "Debate Especial": cinco pessoas a falar ao mesmo tempo — ganha quem tiver microfone mais perto.
- "Grande Reportagem": 20 minutos de música épica para dizer que nada vai mudar.
- "Comentador residente": sabe de tudo, nunca erra… porque nunca diz nada.
O que fazer já (sem pedir licença ao comando)
- Higiene mediática: uma semana sem infotainment. Ler um jornal sério, dois livros curtos, uma conferência gravada.
- Contra-programar: clubes de vizinhança para ver e discutir documentários, ciência, história, orçamento do Estado — sim, o dinheiro é teu.
- Pressão cívica: exigir grelha pública com quotas reais de educação, ciência e cidadania em horário nobre.
- Media literacy nas escolas e fora delas: ensinar a desmontar spins, distinguir facto de opinião, seguir o rasto do dinheiro.
- Apoiar quem não adormece: projetos independentes, podcasts, jornais locais combativos. Trocar "share" por conteúdo.
Conclusão mordaz
As televisões portuguesas não são espelhos: são moldes. Moldam o silêncio, o consentimento e a ignorância útil.
Enquanto o povo for catequizado em HD, a mediocridade continuará a governar em 4K.
A boa notícia? O comando ainda está na tua mão. Mudar de canal é pouco; é preciso mudar de cultura.
E isso começa onde a TV não chega: na cabeça levantada e na língua afiada.
Artigo de Augustus Veritas Lumen in Fragmentos de Caos
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