O Lamento do Arquiteto: “Portugal é o mais pobre da Europa Ocidental”

Há frases que soam a diagnóstico; esta soa a confissão involuntária. Quando um ex-chefe de Governo que abandonou o cargo a meio para subir a um trono europeu surge a declarar, compungido, que Portugal é hoje o mais pobre da Europa Ocidental, a sátira escreve-se sozinha: o bombeiro da pose é o mesmo que ajudou a empilhar o lenhaço.
I. Curriculum de vidro polido
— Primeiro, governa.
— Depois, sai a meio para a cadeira europeia.
— Mais tarde, aterra na prateleira dourada da "alta finança".
— Anos passam, regressa em modo oráculo: "meus senhores, estamos pobres".
Nada disto é ilegal; é apenas pedagogia da hipocrisia. Em Portugal, o manual diz assim: faz o país tropeçar, depois comenta a queda com ar de sábio distante.
II. A pobreza que não caiu do céu
Sim, o país estagnou relativamente. Não por uma única pessoa, mas por um ecossistema de escolhas:
- Produtividade anémica e investimento cronicamente baixo em bens transacionáveis.
- Justiça morosa e previsibilidade regulatória de papel.
- Portas giratórias entre Estado e interesses, que secam o mérito e alimentam o expediente.
- Ciência de powerpoint sem transferência real para produto e exportação.
- Dependência de rendas: turismo, concessões, consultorias eternas — muito IVA, pouca sofisticação.
Quando rebentou a crise financeira, a "ortodoxia" vendida da cúpula europeia empurrou austeridade pró-cíclica; o resultado foi um país que emagreceu músculo e ganhou osso. Hoje, surpresa!, a báscula acusa "pobre".
III. A gramática do choradinho
O "estamos pobres" do comentador de luxo é a versão política do "coitado, morreu". Falta só a nota de rodapé: "estivemos anos a receitar a dieta".
É a retórica do inocente útil: diagnostica-se a febre sem falar do termóstato que se manipulou.
IV. Facto duro, sem espuma
Dependendo da métrica (PIB per capita em PPS, rendimento mediano, riqueza líquida por adulto), Portugal está consistentemente no fundo do pelotão da Europa Ocidental. Podemos discutir vírgulas; o sentido é inequívoco. O somatório de décadas de más escolhas dá isto.
V. O que teria sido útil ouvir (em vez do sermão)
Em vez do lamento tardio, eis cinco frases que fariam história:
- Lei anti–portas giratórias a sério (5–10 anos) para altos cargos públicos e reguladores.
- Justiça económica em fast-track: prazos máximos para litígios comerciais e execução de contratos.
- Reindustrialização inteligente: crédito fiscal forte para I&D + fabrico; compras públicas que puxem inovação nacional (com métricas de produto exportável).
- Transparência radical: todos os contratos públicos e consultorias com datasets abertos, auditorias automáticas e red flags algorítmicas.
- Ciência com ponte para o mercado: financiamento condicionado a protótipos, patentes e faturação; menos congressos, mais pilotos em chão de fábrica.
Isto sim seria governar o futuro, e não narrar o passado como quem lê a ementa depois de almoçar.
VI. Epílogo (com visão)
Portugal não precisa de mais profetas do retrovisor. Precisa de engenheiros do amanhã: gente que troque soundbites por decisões que mexem no código-fonte do país — justiça célere, mérito, indústria, ciência aplicada, transparência brutal.
O resto é barulho.
Satírico, mas justo: quando o ex-capataz da obra volta ao estaleiro a dizer que a casa ficou torta, a resposta não é aplauso — é fita-métrica, prumo e um novo empreiteiro com projeto.
Artigo satírico de Augustus Veritas Lumen in Fragmentos de Caos.
Em entrevista ao podcast "Os Protagonistas" da SIC Notícias, Durão Barroso afirmou claramente:
"Portugal é hoje o mais pobre da Europa Ocidental, como foi antes de Abril de 1974."
Essa frase foi também destacada em publicações como o Polígrafo e o Executive Digest .
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