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Portugal arde, e no palco improvisado da política, dois maestros afinam violinos desafinados para a plateia televisiva. Montenegro, o primeiro-ministro, e Marcelo, o presidente, deixaram a toalha de praia, sacudiram a areia dos tornozelos e vestiram a fatiota gravata-dourada para, juntos, oferecerem ao país um concerto de "coordenação espetacular".

Enquanto as chamas lambem serras, casas e esperanças, a encenação é meticulosa: câmaras estrategicamente posicionadas, frases estudadas, sorrisos calculados. Montenegro declara "esforço máximo" como quem lê o rótulo de um detergente milagroso. Marcelo, com o seu habitual tom paternal, garante que "deu a mão ao Governo" e que tudo corre num compasso exemplar.

Mas lá fora, longe das conferências, os bombeiros rebentam turnos, os meios aéreos falham, as populações improvisam defesas e a meteorologia faz pouco caso das declarações de ocasião.
A "coordenação espetacular" é um mito de gabinete, uma ilusão cuidadosamente embrulhada para consumo mediático — enquanto, na realidade, o Estado continua a reagir tarde, mal e em esforço disperso.

Chamam-lhe "trabalho conjunto" — eu chamo-lhe coreografia do desastre: dois tocadores de ouvido a embalar a opinião pública para que o país não pergunte por que razão, décadas depois, ainda não temos prevenção eficaz, gestão florestal séria e meios prontos antes das chamas.

O mais triste? No próximo verão, quando a tragédia voltar, estes mesmos maestros estarão novamente no palco, de microfone na mão, a tocar a mesma melodia cansada.
E o público, anestesiado pelo espetáculo, aplaudirá — até sentir o cheiro a fumo no quintal.

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Artigo de Francisco Gonçalves in Fragmentos de Caos

Nota do Editor – Fragmentos do Caos
Do areal ao púlpito, em minutos: Montenegro e Marcelo vestem o fato, alinham o discurso e baptizam de "espetacular coordenação" o que no terreno cheira a improviso e fogo por apagar. É o velho truque — quando falta eficácia, sobra encenação.

Ou quando os governantes dão música ao povo e o tratam com criança.

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