Em Portugal, as desigualdades não se revelam apenas no presente: prolongam-se no tempo, cristalizam-se na velhice e expõem o fosso entre o país real e o país do privilégio.

Enquanto a maioria dos portugueses trabalha toda a vida para terminar com pensões médias a rondar os 700 a 800 euros mensais, existe uma elite da função pública que usufrui de reformas acima dos 5.000 euros. São juízes, diplomatas, professores catedráticos, generais, gestores de empresas públicas e altos dirigentes de carreiras especiais.

O privilégio dos poucos

Estes grupos tiveram durante décadas regimes próprios de aposentação, muitas vezes desligados da sustentabilidade da Segurança Social comum. Beneficiaram de regras generosas de cálculo, acumulação de tempo de serviço e, em alguns casos, da indexação direta às últimas remunerações auferidas.

Enquanto os cidadãos comuns enfrentam cortes e penalizações, estes setores mantêm intactas as suas benesses. A narrativa oficial fala de "solidariedade intergeracional", mas a prática consagra uma solidariedade desigual: uns sacrificam-se, outros protegem-se.

Dois países, um Estado

O resultado é um Estado que encerra dois países distintos:

  • O país real, de trabalhadores e reformados que contam cêntimos para pagar medicamentos e contas de luz.
  • O país do privilégio, que assegura para si reformas que ultrapassam o salário líquido de um primeiro-ministro.

Esta disparidade é tanto mais escandalosa quanto são muitas vezes estes mesmos grupos — instalados no aparelho do Estado — que resistem a qualquer tentativa de reforma do sistema de pensões.

A fatura da hipocrisia

Portugal apresenta hoje um dos sistemas de pensões mais desequilibrados da Europa. A fatura recai sobre os ombros das gerações mais jovens, condenadas a contribuir mais, para receber menos — ou, no limite, quase nada.

O fosso entre as reformas douradas e as pensões de sobrevivência mina a coesão social, alimenta o descrédito nas instituições e perpetua a perceção de que o regime é feito para proteger castas, não cidadãos.

Conclusão

Enquanto não se enfrentar de frente esta desigualdade, com coragem e justiça, Portugal continuará a ser um país onde muitos sobrevivem com pensões de miséria, enquanto poucos usufruem da tranquilidade dourada de reformas milionárias.

O povo merece respostas, não desculpas. E merece sobretudo um Estado que não o trate como cidadão de segunda categoria.


Os Dados que Cortam como Navalha

  1. Número de Reformas Douradas (-5 000 €/mês)

Em 2024, cerca de 7 897 ex-funcionários públicos com reformados da CGA receberam pensões acima dos 5 000 €, um salto brutal de 160 % face aos 3 062 registados em 2022 .

Dentro deste grupo, cerca de 410 reformados recebem mais de 8 000 € mensais .

A Segurança Social também não está imune: existem 1 909 pensões acima de 6 111 €, das quais 31 ultrapassam os 15 000 € mensais .

  1. Exemplos de Carreiras Agraciadas

Alguns nomes desfilam como símbolos de um regime abissalmente desigual:

José Gomes Correia, juiz conselheiro do Supremo Tribunal Administrativo — reformou-se com 8 120 €/mês;

Lucília Gago, ex‑Procuradora‑Geral da República — 7 170 €;

Manuel Teixeira Rolo, ex‑Chefe do Estado‑Maior da Força Aérea — 6 442 €;

Anabela Rodrigues, ex‑Ministra da Administração Interna — 5 503 € por mês .

  1. A Tragédia da Maioria Silenciosa

Na Segurança Social, 51 % dos pensionistas de velhice (cerca de 986 200 pessoas) recebiam até 500 €/mês no final de 2024 — valor abaixo do limiar de pobreza (542 €) .

Quase 77 % dos reformados recebem até 750 €/mês .

A pensão média global andava em torno dos 666 €/mês, pouco acima do limiar de pobreza; no regime geral, estava entre os 516–524 € .

Um relatório de 2022 apontava valores médios ainda mais baixos: pensões de velhice por volta de 520 €, de invalidez 414 € e de sobrevivência 269 € .


O Contraste é um Golpe Estético

Grupo Valor Médio da Reforma

Reformados da CGA (elite) ≥ 5 000 €, com alguns > 8 000 €
Pensionistas da Segurança Social (maioria) ~ 520–666 €, muitos < 500 €

Isso não é um fosso. É um abismo que se repete mês após mês, década após década — e que parece amar essa desigualdade.


Conclusões

  1. Introdução Poética

"No silêncio das manhãs frias, os países reais contam cêntimos; no luxo silencioso dos palácios de Estado, correm rios de euros que apenas alguns contemplam…"

  1. Os Números que Ferem

Apresenta os dados de número de pensões superiores a 5 000 €, evolução (2022 → 2024), e exemplos concretos.

  1. Quem Vive à Beira da Miséria

Expõe a realidade silenciosa: mais de metade recebe menos de 500 €, pensão média baixa, e o peso especialmente sobre as mulheres.

  1. A Injustiça Sistémica

Trata dos regimes especiais da função pública, das carreiras protegidas, das acumulações de gratificações e tempo de serviço que superfaturam reformas.

  1. Nos Braços de Dois Países

"Há um país dos que mal conseguem pagar as contas e outro dos que assinam a reforma em cifra de executivo — e ambos respiram sob o mesmo céu."

  1. Ecos de Descrédito Social

Como este sistema mina a confiança no Estado, alimenta a revolta e revigora a sensação de que os cidadãos de segunda classe são maioria silenciosa.

  1. Chamada à Acção

Sugestões: transparência total, revisão das carreiras, alinhar regulação da CGA com a Segurança Social, limites, contributividade real, e equidade redistributiva.

Portugal entre a Média Europeia — mas à Pobreza Comparativa

Em 2021, o gasto médio anual com pensões de velhice por beneficiário na UE foi de mais de 15 000 €. Portugal, por comparação, ficou-se pelos 10 653 € nominais (cerca de 12 132 € em poder de compra), ainda abaixo da média europeia .

Em termos nominais, em 2021, a pensão média mensal variava:

Luxemburgo liderava com 2 575 €/mês,

Bulgária estava na cauda com apenas 226 €/mês,

A média da UE rondava os 1 224 €/mês .

Os "Quatro Grandes" (Itália, Espanha, França, Alemanha) tinham pensões médias entre 1 450 € e 1 560 €/mês .

Interpretação

Portugal serve-se da tábua dos medianos — longe dos luxos do Norte da Europa, mas num patamar numérico que esconde uma tragédia interna ainda mais brutal: enquanto no resto da UE as pensões são, em média, decentes, o tecto atingido pelos reformados da elite pública em Portugal confere-lhe um destaque grotesco.


Custo das Reformas: Portugal entre os que Pesam mais no PIB

A despesa pública em pensões situa-se confortavelmente acima da média da UE (~12 % do PIB). Em 2019, nas análises da Eurostat, Portugal atingiu 13,8 % do PIB somente em pensões .

Isso coloca-nos ao nível de países como França (14,8 %), Itália (16 %) e Grécia (16 %), que também enfrentam o fardo demográfico e dos regimes protegidos .

Reflexão

O Estado português investe proporcionalmente tanto quanto grandes economias no pagamento de pensões — mas centralizadas numa minoria que usufrui de privilégios insondáveis. Um desequilíbrio que grita por reforma.


Idade de Reforma: Portugal está Entre os mais Tardios da Europa

A idade normal de reforma sem cortes em Portugal era de aproximadamente 65,6 anos, acima da média europeia . Apenas sete países da Europa tinham idades mais altas: Alemanha, Dinamarca, Irlanda, Islândia, Noruega, Países Baixos e Reino Unido .

Implicação

Enquanto muitos são empurrados a trabalhar mais tempo para garantir a sua sobrevivência, alguns reformam-se com pensões de luxo — sem vergonha, sem culpa, sempre com o Estado como garante.


Contexto Comparativo Europeu (Resumo)

Indicador Portugal UE Média / Destaque

Pensão média anual ~10 653 € (12 132 € PPC) >15 000 €
Pensão média mensal ~887 € nominal ~1 224 €
Países "Big Four" — Italy ~1 561 €, France/Spain/Germany ~1 450 €
Disparidade (luxo vs base) Há pensões >5 000 € (elite) vs muitos < 500 € (maioria) Menor disparidade interna
Pensão pública como % do PIB ~13,8 % Durchschnitt ~12 %
Idade de reforma sem cortes ~65,6 anos Média abaixo


O Eco Europeu da Injustiça

"Enquanto a Europa exibe pensões dignas e sustentáveis, Portugal aperta-se num salão de extremos. De um lado, o luxo silenciado das reformas douradas. Do outro, o silêncio de quem mal chega ao fim do mês. O Estado ergue o pedestal dos privilégios e esmaga sob o mesmo peso os corpos cansados da maioria."

Esta visão europeizada sulca ainda mais fundo o contraste: não é apenas desigualdade interna — é desajuste histórico e social perante toda uma comunidade.

Artigo da Autoria de Francisco Gonçalves e co-autoria e investigação de Augustus Veritas Lumen in Fragmentos do Caos.

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