Há quem ainda acredite que a justiça portuguesa é cega. Não é. Ela vê perfeitamente — só que usa lentes progressivas: lente dourada para os poderosos, lente de aumento para os pobres.

No banco dos réus, o cidadão comum é tratado como criança malcriada numa escola autoritária. Mal entra na sala, já lhe exigem respeito absoluto:

  • "Levante-se!"
  • "Responda só ao que lhe é perguntado!"
  • "Jure dizer a verdade, toda a verdade e só a verdade!"

O pobre, coitado, cumpre. Trepida, mede palavras, engole revoltas. Sabe que, se levantar o tom, leva logo com uma advertência ou, pior, com uma acusação por desrespeito ao tribunal.

Mas… e quando é o réu um ex-primeiro-ministro como José Sócrates?
Ah, aí o guião muda. A toga treme, a voz do magistrado suaviza, e o palco passa a ser dele:

  • Pode levantar a voz.
  • Pode interromper a juíza.
  • Pode mentir e voltar a mentir, sem consequência.
  • Pode transformar a audiência numa comédia trágica, aos gritos e ironias.

E nada acontece. Nenhum polícia o acompanha à porta. Nenhuma multa por desacato. Nenhuma punição exemplar.
É a velha regra lusitana: para os amigos, tudo; para os inimigos, a lei.


O Tapete da Toga

A toga, que deveria simbolizar imparcialidade e autoridade, serve nestes casos de tapete de entrada para os sapatos enlameados dos intocáveis. O tribunal é um palco de representação, e o guião já vem escrito: o poderoso entra e sai de cabeça erguida, mesmo que tenha cuspido em todos os princípios da justiça durante a sessão.


Uma Democracia de Canalhas

Chamam-lhe democracia, mas é um teatro com bilhetes VIP para canalhas. O povo assiste, indignado mas impotente, enquanto a elite política e económica desfila pelas salas de audiência com a arrogância de quem sabe que ali nada lhes pode tocar.

Se Kafka tivesse vivido em Portugal, não teria escrito "O Processo" — teria escrito "O Espectáculo", e talvez acrescentasse uma dedicatória: "A todos os que descobriram que a justiça é apenas uma cerimónia para disciplinar pobres e absolver poderosos."


Conclusão?
Enquanto a lei for um texto sagrado para os fracos e um folheto descartável para os fortes, esta democracia continuará a ser aquilo que já é: uma democracia de canalhas, administrada por togados que confundem equidade com reverência aos grandes nomes.


Artigo de autoria de Augustus Veritas

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