Portugal arde.
Arde o pinhal, arde o mato, arde o futuro.

E com ele arde também a esperança — sufocada entre labaredas de incúria, incompetência e crime.
Todos os verões, como uma missa negra repetida, assistimos ao mesmo ritual de desgraça: aldeias cercadas, idosos em fuga, bombeiros exaustos, e autoridades com discursos gastos.

Mas não é a natureza que está a falhar.
É o sistema.
É o país institucional que se demitiu de prever, planear, agir.
É o crime organizado que lucra com a desgraça.
É a negligência transformada em política pública.

A Incuria:

Os relatórios de 2017 e 2018 dormem em prateleiras poeirentas dos gabinetes ministeriais.
A limpeza de matas é feita ao sabor da sorte — ou do compadrio.
As estradas sem corta-fogos, as zonas industriais coladas à floresta, os parques naturais esquecidos.
E ninguém é responsabilizado. Porque em Portugal, o esquecimento é um escudo e a memória um luxo.

A Incompetência:

Ano após ano, o mesmo guião:

  • Aviões a chegar tarde.
  • Meios dispersos, mal coordenados.
  • Sistemas de comunicações falham quando mais se precisa.
  • Milhões investidos — ou desviados — e o fogo vence sempre.

O Crime:

Sim, porque há interesses.
Há madeira a preço de cinzas.
Há projetos turísticos que precisam de "limpar terreno".
Há empresas de segurança privada que surgem após o caos.
Há redes de incendiários pagos, que o sistema judicial raramente condena.

E o povo?

O povo apaga as brasas com lágrimas e mangueiras de jardim.
Constrói casas que serão varridas de novo no próximo verão.
Enterra os seus e ouve os mesmos discursos nas televisões — onde um ministro de fato impecável diz que "não podia ter sido evitado".

Mas podia.
Podia, se houvesse visão.
Podia, se houvesse coragem.
Podia, se o país fosse governado por quem ama a terra, não por quem a vende em lotes.


Conclusão:

Os incêndios em Portugal não são apenas tragédias naturais.
São crimes de omissão, são sinais de um país sem estratégia florestal, sem justiça eficaz e sem vergonha na cara.
Enquanto não se criminalizar a incúria, responsabilizar a incompetência e desmantelar o lucro com a desgraça, Portugal continuará a arder — por fora e por dentro.

Porque a floresta queimada é também metáfora de um Estado que perdeu a alma e queima os seus vivos antes que estejam mortos.


Artigo de Francisco Gonçalves in Portugal a arder

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