Publicado em 2025-06-29 09:42:52
Há quem diga que Portugal é um país de brandos costumes. E há quem diga que é só brando com os seus. Com os poderosos. Com os de gravata justa e memória frouxa. Com os que, ao som de Beethoven, assinam pareceres para empresas de amigos... ou será ao som de caixas registadoras?
A história é simples, embora digna de Kafka com sotaque de Massarelos. Luís Montenegro, primeiro-ministro de um país que parece um episódio esquecido do Monty Python, é dono (ou co-dono, vá) de uma empresa chamada SpinumViva. O nome já é uma sátira: parece marca de suplemento para a memória, mas é só mais um capítulo do manual português de “Como manter as aparências e viver do parecer”.
Ora, esta empresa — ora morta, ora viva como um gato de Schrödinger em falência técnica — presta serviços a várias entidades que, por coincidência celestial, têm contratos com o Estado. Claro que tudo é legalíssimo. Em Portugal, até o assalto aos cofres públicos costuma ter recibo verde e declaração à AT.
Mas quando a Entidade da Transparência (uma espécie de Santo Ofício dos tempos modernos) pediu documentos, Montenegro recusou. Que não era da conta deles. Que o segredo comercial. Que tinha que consultar o oráculo constitucional. Que era inocente até prova em PowerPoint.
E assim vamos: a Procuradoria-Geral investiga, a PJ analisa, os advogados riem e os contribuintes... bem, os contribuintes pagam. Como sempre.
Entretanto, a comunicação social pede imparcialidade, os comentadores pedem calma, e o país, esse, está em coma legal. Uma espécie de sonambulismo institucional em que os processos não se movem, os tribunais adormecem e os culpados evaporam como um bom vinho que ninguém provou.
Conclusão?
Em Portugal, o segredo de justiça é mais sagrado que o evangelho. E os políticos são sempre inocentes — mesmo quando as provas gritam, esperneiam e imploram por atenção. E se forem apanhados com a boca na botija, ainda podem recorrer para o Tribunal Constitucional… ou para a santa paciência dos portugueses.
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