Publicado em 2025-06-03 12:39:56
Por Francisco Gonçalves & Augustus Veritas
José Sócrates, ex-primeiro-ministro, arguido em processos de corrupção, branqueamento de capitais e fraude fiscal, continua a desfilar nos ecrãs de televisão como se fosse um oráculo incompreendido. Aparece sorridente, com pose de vítima e discurso de iluminado, rodeado por comentadores que o tratam com um respeito que não se deve a quem está por julgar, mas a quem ainda controla bastidores.
Não foi condenado. Nem sequer julgado. Porque, em Portugal, a justiça caminha com muletas, tropeça em prazos, escorrega em tecnicalidades e, no fim, adormece no colo de quem lhe paga o sono.
A lentidão do processo judicial não é apenas uma falha: é um sintoma de um Estado capturado por interesses. O caso Sócrates dura há mais de uma década. E o que era para ser um julgamento tornou-se um espétaculo de circo institucional: juízes hesitantes, procuradores silenciosos, advogados altivos e opinadores de gravata a normalizar a ignomínia.
Enquanto isso, o cidadão honesto paga os seus impostos, espera anos por uma decisão de tribunal administrativo e assiste, impotente, à ascensão dos que roubaram com luvas brancas.
Sócrates fala. Opina. Dá entrevistas como se fosse um comentador isento. Reescreve a narrativa com uma facilidade que envergonharia qualquer ficcionista.
Como é possível que um homem sob acusação por corrupção milionária tenha mais tempo de antena do que um professor, um médico ou um juiz honesto?
Porque o regime gosta de se ver ao espelho. E Sócrates é o reflexo perfeito da elite portuguesa: vigarista, arrogante, impune.
Enquanto os tribunais se arrastam com Sócrates, o fisco continua a devorar o pequeno contribuinte. Empreendedores, reformados, trabalhadores por conta de outrem — todos são controlados, perseguidos, auditados. Mas os verdadeiros criminosos têm contadores criativos e tempo do seu lado.
O caso Sócrates não é um escândalo isolado. É a série completa. Uma novela com produção milionária, argumentistas com carreira na magistratura, figurantes pagos com os nossos impostos, e um protagonista que recusa sair de cena.
Portugal não é um Estado de Direito. É um teatro do absurdo, onde os que cumprem a lei vivem com medo, e os que a violam vivem do aplauso.
Não há reforma política ou económica possível enquanto a justiça for uma comédia trágica. Sócrates não é apenas um homem — é o símbolo de tudo o que falhou em Portugal desde o 25 de Abril: um regime que nunca se limpou, que nunca se refundou, e que insiste em punir os que vivem de forma limpa.
Se queremos um país justo, não basta esperar que a justiça funcione. É preciso exigir que funcione. E quando ela falha sistematicamente, talvez esteja na hora de reformar o próprio sistema.
A verdadeira vergonha não é o vigarista — é quem o deixa continuar a mandar.