Publicado em 2025-06-28 15:31:48
Vivemos num tempo em que tudo é urgente — menos o pensamento.
A verdade, outrora buscada com paciência, suor e silêncio interior, tornou-se hoje um produto de prateleira digital. E como todos os produtos embalados à pressa, tem data de validade curta e composição duvidosa.
A sofreguidão com que se grita “Quero a verdade, já!” revela não sede de sabedoria, mas fome de certezas rápidas, fáceis e reconfortantes. O mundo transformou-se num grande pronto-a-vestir da verdade, onde cada um escolhe o tamanho da sua ilusão, a cor da sua narrativa, e paga com likes ou indignações passageiras.
E assim surgem os charlatães — com fala mansa, gravata justa e certezas absolutas. Vendem “verdades” de pacote, embrulhadas em slogans, alimentadas por algoritmos, e partilhadas por milhares sem pestanejar. São os novos deuses do imediato, os donos do verbo inflamado, os escultores da pós-verdade.
“Aquele que procura a verdade com carácter de urgência e a exige com impaciência, depressa encontrará um esperto que o enganará.”
Neste tempo febril, já não importa tanto se é verdade — apenas se parece verdade. Se alivia a ansiedade, se confirma o preconceito, se permite dormir com a ilusão de que se sabe algo.
A verdade verdadeira? Essa continua ali, escondida, entre as páginas de um livro, nos silêncios entre dois pensamentos, no desconforto de uma dúvida bem colocada. Mas poucos têm hoje o tempo — ou a coragem — de lá ir.
Eis o sinal dos tempos: confundimos velocidade com sabedoria, e acabamos reféns de quem nos promete tudo... antes mesmo de sabermos o que procuramos.
Artigo da autoria de Francisco Gonçalves in Fragmentos de Caos