A Nova Lei dos Solos: Solução ou Armadilha para a Habitação em Portugal?

Publicado em 2025-03-02 18:30:05

A recente alteração à Lei dos Solos tem sido apresentada pelo governo como um passo essencial para resolver a crise da habitação em Portugal. A ideia central da medida é simples: libertar mais terrenos para construção, permitindo um aumento da oferta habitacional e, em teoria, uma descida dos preços das casas. No entanto, um olhar mais atento revela que esta proposta pode ser mais um presente envenenado do que uma verdadeira solução para os problemas estruturais do setor imobiliário.

O Argumento do Governo: Mais Terrenos, Casas Mais Baratas?

Os defensores da nova lei argumentam que a falta de terrenos disponíveis para construção tem limitado a oferta de habitação, contribuindo para o aumento dos preços. A ideia é que, ao facilitar a urbanização de mais terrenos, se criem condições para a construção de novas habitações, aumentando a oferta e, consequentemente, reduzindo os preços no mercado.

Na teoria económica clássica da oferta e da procura, esta lógica faz sentido. Mas a realidade do setor imobiliário português é bem mais complexa. O que os políticos ignoram – ou fingem ignorar – é que o problema da habitação em Portugal não está apenas na falta de terrenos, mas na dinâmica especulativa que domina o mercado.

Quem Controla o Mercado Imobiliário?

Os preços das casas em Portugal não são apenas determinados pela oferta e procura naturais, mas também por grandes grupos económicos, fundos de investimento e cartéis do setor da construção e imobiliário. Estes agentes têm enorme influência sobre o mercado e conseguem manter os preços artificialmente elevados, independentemente da quantidade de terrenos disponíveis.

Se os grandes promotores não tiverem interesse em baixar os preços – porque ganham mais com a valorização dos imóveis – a nova lei pode simplesmente resultar em mais terrenos urbanizáveis sem impacto real na acessibilidade da habitação. Pelo contrário, pode levar a mais especulação: os terrenos liberados serão comprados pelos grandes investidores, que os manterão inativos até que o preço seja conveniente para eles.

Os Riscos de um Crescimento Descontrolado

Outro problema grave desta lei é que pode levar a um crescimento urbano descontrolado, sem a devida infraestrutura. Novas áreas de construção exigem investimentos públicos em estradas, transportes, redes de água, saneamento, escolas e hospitais. Se estas expansões não forem bem planeadas, o resultado será um aumento exponencial da despesa pública, que recairá sobre os contribuintes.

Além disso, uma urbanização mal regulada pode ter consequências ambientais sérias, destruindo zonas verdes, aumentando a impermeabilização do solo e agravando problemas como o excesso de tráfego e a falta de transportes públicos eficientes.

O Que Realmente Poderia Resolver a Crise da Habitação?

Se o objetivo fosse realmente tornar a habitação acessível, haveria outras medidas mais eficazes do que simplesmente abrir mais terrenos para construção. Algumas possíveis soluções seriam:

  1. Regulação dos preços da habitação – Impedir a especulação desenfreada e estabelecer limites para aumentos abusivos das rendas.
  2. Impostos sobre casas devolutas – Forçar proprietários e investidores a colocar os imóveis no mercado, em vez de mantê-los vazios para valorização especulativa.
  3. Incentivo à reabilitação urbana – Em vez de expandir a mancha urbana, criar incentivos para renovar edifícios existentes e ocupá-los de forma eficiente.
  4. Apoio à habitação pública e cooperativa – Investir em modelos de habitação pública ou cooperativa, reduzindo a dependência do mercado especulativo.
  5. Controle sobre o investimento estrangeiro especulativo – Regular a compra de imóveis por fundos de investimento e estrangeiros que apenas visam a especulação.

Conclusão: Uma Lei Feita à Medida de Quem?

A alteração à Lei dos Solos pode parecer, à primeira vista, uma tentativa séria de resolver a crise da habitação. Mas, na prática, parece mais uma medida desenhada para beneficiar os grandes grupos do setor imobiliário do que para ajudar os cidadãos comuns.

Ao invés de criar soluções estruturais, o governo optou por uma estratégia que pode agravar a especulação imobiliária, gerar construção desordenada e aumentar a despesa pública. Enquanto isso, os preços continuarão a ser determinados por quem controla o mercado, e a habitação acessível continuará a ser um sonho distante para milhares de portugueses.

Diante deste cenário, a grande questão que fica é: esta lei foi feita para resolver a crise da habitação ou para proteger os interesses dos mesmos de sempre?

Francisco Gonçalves

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